26.11.14

O que tem sido o trabalho da Associação Templ'Anima

        

Acerca das  interrogacoes de alguns sobre a contribuicao da associacao Templ’Anima
para a Rota Templaria Europeia.                                                              

Recem chegados a Camara, alguns vereadores da oposicao, desconhecem certas coisas nomeadamente os
contactos e o empenhamento de varios anos quanto ao trabalho desta Associacao... mas se nao sabem quem somos , bastava indagarem junto de um seu colega partidario, o prof. Luis Graca , que ficavam plenamente a saber quem nos eramos e o que temos feito...

Mas ja que a pergunta saiu publicamente nos jornais, vamos la elucidar o assunto. Efectivamente quanto a nos o criterio de escolha so pode ser o contributo para a causa , diremos  que um convite pontual a quem se
especializou nessa Demanda , para colocar Tomar realmente visivel na Europa.  Muito simples: nos somos os iniciadores dessa  Rota especifica, apresentamos essa ideia desde a nossa fundacao em 2006, esta’  nos
objectivos Estatutarios,  esta’  no nosso Blog (que mostra algum do trabalho feito) e  foi  publicado  o lancamento dessa ideia concreta - a comecar pelo berço (Troyes) da Ordem antiga -  nos jornais de Tomar  em 2oo6. E  mais , ninguem durante muito tempo, varios anos, aflorou o assunto publicamente.

O que fizemos depois:  A  elaboracao de um texto bastante pesquizado para a representacao especifica de
algo efectivamente ligado ao castelo templario: a admissao de um cavaleiro na Ordem ,com base na historiadora Regine Pernoud, (nao uma  representacao  sobre a vida generica passada  em qualquer mosteiro)  ou seja :criamos um texto de animacao teatral de   raiz para representar in su situ, intitulado Didake (Iniciacao)..
Depois elaboramos e publicamos um estudo  sobra a gastronomia da epoca templaria , com base no receituario internacional da epoca e fizemos  uma selecao de pratos devidamente datados ao lado no menu,  que apresentamos  experimentalmente para numerosas pessoas enquanto alimentacao templaria, tanto em espacos do Convento, como ca em baixo, nomeadamente o almoco de obito do Mestre, na galeria da igreja de S,Maria, nunca ai feito, nem antes nem depois,  nos 850 anos de Tomar.

                  

Trouxemos ,desde a Se de Lisboa, a Tomar o relicario e obra de arte - A Mao de S.Gregorio -  trazido por
Gualdim Pais da Terra Santa e que os tomarenses ja nao viam quase ha 2oo anos desde as desamortizacoes
dos conventos.Obra exposta em S.Maria a 13 de 0utubro 2007.

               

Elaboramos e desenhamos a lapide com a lista dos mestres sepultos no Panteao templario de S,Maria e
finalmemte la colocada com o apoio da  Camara  nomeadamente,  em Outubro de 2011. Esta  la na capela
gualdinica,enquanto contribuicao para uma maior visibilidade da natureza daquela igreja;  vao ve-la como
memoria do Templo, ao menos ,,Non nobis,,,

          

Acresce a isso tb a devolucao a Tomar do Hino a Gualdim, feito por Alfredo Keil ha uns 120 anos e que se
perdera  completamente da memoria das bandas da cidade, que encontramos no espolio de Alfredo Keil no
museu da Musica em Lisboa. Trouxemos uma copia do original para ser adaptado aos instrumentos que hoje as bandas usam. Finalmente a banda filarmonica G.Pais editou o hino a partir daquela copia, actualizando-a..Tambem a categorizada Banda sinfonica da GNR em Lisboa  (no seguimento de uma nossa solicitacao a um seu musico) tem pronta uma nova versao, para ser estreada em Tomar .

Entretanto tambem recuperamos a imagem possivel do primitivo selo do Concelho de Thomar , com base na descriçao feita por Pinho Leal , adicionando-lhe um design de epoca, com base em figuras coevas.

           

Em 2012, interessamo-nos por uma exposicao e  Coloquio templario internacional a realizar em Troyes em
Outubro de 2012. Inscrevemos um nosso menbro historiador ,o prof. Ernesto Jana ,nesse  coloquio e fomos a nossas expensas participar no Coloquio em Franca (as Actas, com as intervencoes  dos maiores especialistas mundiais em templarios presentes e visiveis na foto de conjunto em cima com Mr. Adnot , estao publicadas desde o ano passado);  tendo aproveitado os intervalos e refeicoes dos 3 dias do coloquio para expor as nossas ideias quanto a pertinencia de uma rota templaria europeia inexistente e autentico nicho de mercado turistico-cultural devido a atencao constante e universal sobre a mais famosa Ordem medieval.

De ai para ca, fizemos o Inventario de lugares templarios na Europa, nos 6 principais paises templarios da
Europa e selecionamos 10/12 sitios em cada um desses paises com algo ainda de pe para turista ver e
comprender culturalmente. Inventario entregue a ex-Regiao de Turismo dos Templarios. Em termos de Portugal,desenhamos 5 circuitos comentados de sitios templarios de Norte a Sul e ja publicados no nosso Blog, para quem os queira fazer, com base num criterio cientifico (Tese do arq. Nuno Vilamariz)..

Fizemos entretanto varios contactos escritos (mails)  para a presidencia da Camara , no tempo da vereacao
PSD, e  quase nada fizeram para se interessar pelo assunto da Rota templaria. Alias o habito de ao inves serem abordados para rotas disto e daquilo por outros, nomeadamente os espanhois, e’  tao comum...que ate agora ainda alguem intitulou uma noticia sobre a Rota como: " Tomar vai integrar uma Rota templaria europeia" como se fosse algo criado por outros !!!...quando na realidade, Portugal tem agora a iniciativa e a base para criar uma Rota ao inves de andar a reboque dos outros...Pq somos simplesmente quem tem a sede monumental templaria europeia mais completa (Paris perdeu a Igreja redonda, Londres perdeu a envolvente amuralhada)...Tao so isto. .
                                                                                                                                       

Ora e voltando a Troyes , que reconheceu essa importancia : enviaram uma carta a Camara de Tomar,
com copia a nos, que eramos o seu unico contacto de referencia , disponibilizando-se para conjuntamente
montarem a Rota. E ja este ano em 18 marco no dia do  VII centenario da morte do ultimo mestre
templario Jacques de Molay , emitiram e publicaram uma noticia conjunta connosco em que declaravam
publicamente a intencao de criar a Rota..
De realcar tb que ja o ano passado nos tinha visitado uma delegacao de Troyes, que visitou connosco (Templanima) o triangulo templario, Castelo de Tomar, Almorol e Dornes, tendo almocado com o presidente Carrao na estalagem do Mouchao em maio 2113

Naturalmente agora , so poderiam incluir-nos  ( com tais antecedentes) na retribuicao da visita, sendo alias
a unica pessoa da Delegacao  que o Departamento de  L’Aube  conhecia e  que desejavam efectivamente
que estivesse presente .Somos credenciados assim para contribuir para a Rota naturalmente com o
trabalho feito e quem pretende colocar-nos em alternativa com Ordens iniciaticas ou  confessionais nao
faz sentido ou ideia de uma Rota cultural europeia;  vejam as 29 rotas homologadas pelo Instituto Europeu
das Rotas, vejam de que forma sao construidas, que nao tem nada a ver com as redes ja feitas de Ordens
neotemplarias mundiais que nao sao turisticas mas de outra indole.participativa. Claro como em tudo hao-
de aparecer sempre alguns oportunistas a tentar mostrar-se a frente...se e’ que nao apareceram ja’ !
E que fique claro tambem  que nao se trata de uma oportunidade para mais um negocio financiado de desenvolvimento local interior , mas sim trata-se de desenvolvimento cultural ligado a um patrimonio pre-existente, de epoca templaria..e quando dizemos templario nao quer dizer que o e´pq esta na regiao dos antigos  templarios , como folclore ou  qualquer especialidade moderna comestivel, tem a ver sim com o residuo das verdadeiras raizes , tal deve ser a animaçao do lugar e especifica dele sempre quer possivel, nao importada.
Em suma : há que atender aos campos de acção e a metodologia do Instituto das Rotas Europeias com sede no Luxemburgo, para que a Rota seja vallidada.

Finalmente  quanto a contactos  havidos com a Camara : tivemos reunioes , nomeadamente em junho com a
presidente Anabela  e a diretora cultural Ana Soares, para alem de outros telefonicos ao aproximar da data
de partida. E e tudo da nossa parte , o resto e politiquice interna, que a continuar fomentando impasses,
so levara a perda de iniciativa de Tomar e  podera’ ate levar a que  outros, no estrangeiro ,peguem  no conhecimento que tem dos dossiers e facam eles a Rota , sem mais duvidas...




25.11.14

Tomar e Troyes acertam-se para a Rota templaria



Pela primeira vez Portugal tem a INICIATIVA de criar e propor uma ROTA efectivamente INTERNACIONAL , a partir da Tomar Templaria, unindo em rede os lugares daquela famosa Ordem medieval , já inventariados por nós, nos seis principais paises europeus onde ela existiu ! 
Diferentemente do que titulou um jornal nabantino (acostumados que estao a que sempre sejam outros a vir-nos propor aderencia a algo ja existente) : Tomar (nao ) vai "integrar " Rota Europeia de Cidades Templarias...Tomar esta' iniciando essa Rota Templaria (enquanto sede medieva mais completa na Europa) e esta' convidando outros lugares da tradicao templaria europeia a unir-se em rede...
Trata-se de um nicho de oportunidade, uma Rota especifica da Ordem mais famosa medieval, o que foi reconhecido pelos franceses que querem montar a rota connosco enquanto co-fundadores.




Para tratar da Rota Templaria Europeia reunimos na ultima semana de outubro em Troyes (França) com Philippe Adnot, presidente do Conselho Geral de L'Aube , Christelle Taillardat directora do Turismo departamental e Valerie Gilet especialista da ordem templária ,entre outros , com a participação de varios elementos ligados à Camara de Tomar.

Depois de uma apresentaçao informal, no seguimento do nosso trabalho inicial realizado ha precisamente 2 anos, a quando do Coloquio templario em Troyes , seguiu-se uma visita aos lugares emblematicos da região , como a Catedral do concilio que regrou a Ordem, a comenda de Avalleur, o museu de Payns terra do fundador da Ordem e os Arquivos departamentais de L'Aube.




Finalmente realizou-se a reuniao entre as duas delegacões , onde ficou acordado a formaçao de 2 grupos de trabalho , um sobre o Projecto da Carta de sitios e os criterios de adesao, outro sobre Meios de Comunicação o logo universal(proposta da n/cruz redonda, denotando a origem oriental e bizantina da Ordem) , a promoção dos lugares (incluindo a sua animaçao especifica, nao generica ) e a sua comercialização .










26.10.14

III - Afinal,quais são as origens e o que representa Santa Iria ? (Conclusão)

.
3- Acerca da doação do rei Afonso aos pobres de Thomar...
(excertos de O Mestre Templario na Fundação de Portugal
 
Quanto ao rei Afonso,pode agora descansar um pouco, reconhecido o seu reino pela mais alta instância ocidental da época - a Santa Sé- e porque a idade já lhe pesa, faz 
redigir o seu testamento ainda neste ano de 79.
Deixa grandes somas de dinheiro para as obras pias: entre elas, 1.000 marevedis para os pobres de Tomar e outras localidades da Estremadura. Deixa também à Ordem de cavalaria de Evora, 4.000 maravedis para defesa da cidade,além dos  animais e mouros que o rei tinha em Santarém e Lisboa...
Ora a referência à pobreza em Tomar, não se conhecendo grande crise agricola ou climática na época, só pode ser a confirmação do grande acréscimo populacional da região - excesso mesmo de candidatos a povoadores vindos do Norte - nem todos seenquadram facilmente nos sesmos em distribuição, constituindo uma camada marginal à espera de melhor sorte... O desiquilíbrio próximo entre recursos e população, será terreno próprio para propostas messiânicas que hão-de chegar com os “fraticelli” ao Vale Bom e Ceisseira mais tarde. Talvez porque as zonas de arroteia e de sequeiro não fossem suficientemente favoraveis à frutificação, cria-se no termo da vila uma zona de insegurança que vai perdurar. Daí que Gualdim querendo fazer justiça ao povo, agrave na prática as penas para os ladrões no termo de Thomar , cuja existência o segundo foral dado já prenunciava...

 E correndo rumores de maus tratos a viajantes nos caminhos, breve nascerá mais uma estória de martírio nos arredores: Santa Cita (regionalização popular de um culto pregado como exempla, pelos franciscanos e com origem em Luca/Italia, onde esta criada de um tal Fatinelli , foi modelo de virtude e trabalho e depois de morta, padroeira da justiça, segundo Dante). A expressão última dos problemas miticizados na região, talvez se encontre na trova 237 do rei Afonso o Sábio que canta uma mulher que indo no caminho de Santarém para Leiria, é atacada por alguns salteadores que a tomam pelos cabelos, querendo satisfazer seus desejos nela, ao que ela se defende, perante o que a desnudam e degolam e escondem seu corpo sob arbustos. Coincidentemente: a lenda de S. Cita local ou o brazão em quarteis de Tomar, que mostrava uma S. Iria degolada e seu corpo sob uma árvore ... Significativo se atentarmos a que já perto de Leiria, em Reguengo do Fetal aparece uma nova morada de S. Iria, na tradição local... À luz deste último dado, somos levados a pensar que, à semelhança de um distrito de Iria na Galiza, estamos aqui perante uma nova região de Iria: toda a região centro-norte estremenha (de Sant’Iria, al’Iria) que inclui Santarém, Tomar, Cova de Iria, Leiria... com todas as conjunções que isso possa implicar! E voltando , ainda uma vez e última, à estória de Iria : há contudo outras contribuições mais ou menos visíveis ,estas com origem nos tempos da Hespanha moçárabe. Para além do breviário de Évora - contendo a versão fixada em definitivo - ter sido impresso em Sevilha (denotando uma ligação antiga), sabe-se que no final do milénio, os “Povos do Livro” no Andaluz viviam um tempo de coexistência: em que Fátima considerava Maria sua irmã, o monge Recesmundo servia de embaixador de Córdoba em Constantinopla,enquanto esta enviava um Mestre Mosaísta para as obras do califa... Tempo este, em que se forjou também a estória xiita/fatimita do último Imã (o duodécimo ou o oculto)...


(S.Zita: 1212-1272 santa italiana de Lucca/Toscania, padroeira das empregadas domesticas. Logo após sua morte um culto popular cresceu a sua volta e expandiu-se por toda a Europa) 


Vejamos agora os pontos de contacto da versão árabe (referida por Moisés Espirito Santo) com a estória de Iria :


 • No século IX (868)uma rapariga cristã (cativa) da fé de Bizâncio, medita à beira do rio, sobre uma carta-mensagem escrita em grego... Tal como aqui, Iria, freira, medita a palavra de Deus, à beira do rio, no mosteiro godo de influências orientais.
 • O sobrinho do imperador é seu pretendente, mas é rejeitado e desmaia: ela jura não se casar com mais ninguém a não ser o “escolhido”..Aqui,o filho do governador (Britaldo) seu pretendente é também rejeitado e adoece, Iria jura não ser de mais ninguém a não ser o Filho de Deus.
 • Presságio funesto:os idolos e colunas do paço são quebrados, há um declinio da religião existente a favor de outra nascente - o Corão... Aqui,Remígio, o monge godo assediador de Iria, imagem, da degenerescência da igreja goda, finalizando pela invasão dos homens do Corão,que destroem o paço do governador e seus templosarrasando tudo.
 • Na “noite do destino” um véu a cobre, enquanto a poção (beberragem) da união faz o seu efeito, tornando-a grávida do último Imã...Aqui,às matinas - aparecendo como que grávida, por efeito da beberragem de Remígio - Iria une-se a Deus pelo martírio (a mando de Britaldo despeitado)...e é lançada á agua.

 Do exposto,afigura-se-nos a presença de uma certa memória sincrética na fixação da estória de Iria, pois que a Espanha moçárabe estavaaberta á influência do mundo islãmico.. E sem dúvida, memória mais próxima ,do que aquela outra de Tessalónica que afirma Iria exposta em casa de prostituição e depois morta na fogueira, por se recusar a fazer sacrificios aos Deuses pagãos no ano 303, penúltimo de Diocleciano. Este ano serve de “marca” ao início de um novo ciclo de oito anos de perseguição aos cristãos; mas segundo Lactâncio - um cristão coevo - a repressão é moderada, tomando um carácter mais genérico de fecho de igrejas para corrupção dos crentes) e queima de livros sagrados... Aliás esta ligação ao fogo ou água, das duas estórias de Iria, revela porventura uma cristianização de cultos pagãos, mesmo pré-romanos. Efectivamente é conhecida da antiguidade uma estatueta de Eirene com uma criança pela mão: Pluto, Deus das riquezas. Segundo a mitologia, Eirene é filha de Jupiter (origem do raio, logo do fogo) ou Neptuno (Deus das águas).E,tal como Fortuna ,(encontrada no conventus scalabitano)é uma Deusa soberana, protectora da terra: daí as várias Eiren assinaladas em terras da Galecia. Em medalhões, Fortuna é representada tendo a seu lado uma árvore e aras com fogo:A Iria grega é sujeita ao fogo...A Iria lusitana representa-se com uma árvore (em um dos quarteis do selo)... Mais: a Fortuna de Servio Tulio tinha a sua festa em Abril(tal como a Iria grega), enquanto a Fortuna da era de Augusto, tinha sua festa em Outubro (tal como a Iria lusitana)...

 Significativamente a sua associação às águas –no nosso caso, o corpo transportado pelo rio da lenda medieval- acaba por fazer ligar, ao rio de Tomar, o epiteto de Nabão ( Nava de Juncoso ) derivação de Nabiae, a deusa (pré-romana) que mora nos rios e é condutora dos mortos ao mais além, segundo a religião celta... (Coincidência significativa: também na região de Burgos, no vale de Losa, há um rio Nabón ,que segue paralelamente a uma estrada que nos conduz a uma igreja templária , dedicada ao mártir S.Pantaleão,e cuja fachada ostenta uma iconografia ligada á lenda do santo Graal)... Aqui perto, na zona de Pedrogão Pequeno/ Sertã há uma pequena capela nas margens do Zêzere onde existe uma ara á deusa Nabiae e onde durante séculos até recentemente, o povo invocava a Senhora das Águas Feras (revoltas/férteis) para aplacar os excessos das enchentes devastando as culturas marginais ou quando queria atravessar simplesmente o seu curso turbulento. Ali se encontra aliás uma das maiores colecções de estelas funerárias templárias da região central ou do san’Graal... A via romana de Emerita foi fonte de irradiação do culto a Nabiae.


Por outro lado a evidência de certos ritos funerários na chamada Gruta dos Ossos – aqui a duas léguas da cidade, nas margens do rio – tal como o culto guerreiro a Mars ou os Touros Votivos, são também marcas comprovando a presença na região dos cultos pré-romanos. Efectivamente, á entrada dessa gruta/necrópole estão dispostas em forma de crescente lunar(lúnula) uma série de cabeças...significando este culto, descida ás profundezas da terra,uma identificação com a terra-mãe, esperança de fertilidade,eterno retorno, ressureição, como o papel das Horas/ estações , a que Iria pertence. Curiosamente em El Padron, antiga Iria galega, há também uma ara cujo radical sugere Nabiae, o que considerando ser ali junto a Compostela, que passa o rio Tambre (Thamara), será outra coincidência significativa...

 - Adendas sobre a hipotese de cultos Isiacos


(Procissão á deusa Isis - Pintura de Frederick Bridgeman /1902 )

 No antigo Egipto, Isis, a deusa dos mil nomes, a que concedia a cevada e o trigo, era cultuada através de uma procissão de crentes: na frente ia o chantre com o simbolo da música, um livro de hinos teológicos e outro de regras de conduta; seguia-o o horóscopo com o símbolo da astrologia - um ramo de palmeiro- e os quatro livros herméticos sobre os astros; após o que vinha o Escriba sagrado, complumas na cabeça, na mão a régua ,o tinteiro e a cana para a escrita hieroglífica; depois o Estolista com a vara da justiça e a taça das libações;finalmente o profeta com sua túnica, em cujas dobras leva a Urna sagrada exposta. Acompanhando os ministros da classe superior, seguem-se outras classes de fieis, como os pastophoros ou curandeiros e os que levam os pães.
 A propósito dos pães em procissão - é bom lembrar - que a região de Sellium (hoje Tomar) se integrava no tempo dos romanos em plena rota isíaca para Emerita, onde descansavam as legiões; há referências, pelo menos em dois lugares, nessa via a aras votivas dedicadas pelas sacerdotizas romanas de Isis : em Tucei e Cabrei (vide Hubner, CIL II ) . Podemos pois dizer que haveria aqui também um culto isíaco ( a que nao serão estranhos portanto os pães dos Tabuleiros, como nas festas de Isis) ...não será por acaso que quando fizeram o convento da S.Iria conservaram uma lapide com uma vaca (das varias que aqui se encontraram) e a colocaram por baixo da imagem da santa sobre o rio...a vaca simbolo de Isis...lá continua como memoria visivel...(tal como em Braga ,a Sé local era antes um templo a Isis )...

22.10.14

II - Afinal,quais são as origens e o que representa Santa Iria ? (Continuação)



Na imagem acima, Santa Casta, uma das tias de Iria, outra santa bem modernizada agora com um "new look"  (repintada) que esta' na igreja de Almogadel, perto de Tomar...
Interrogamo-nos hoje, na continuação desta estoria, se nao terá  viajado  santa Iria, entre Tomar e Santarém, sim, mas em sentido contrário ao da lenda e pela velha estrada romana, com os cavaleiros do Templo provávelmente...

2- A proposito da descoberta de Thomar, a abandonada...
E descendo os cavaleiros contra poente ali descobrem outras salas com seu pavimento ladrilhado de tijolos e, por uma abertura no terreno abatido, ali vêem umas criptas ou casas subterrâneas abobadadas (vide J. Sousa,1903),talvez sistema de aquecimento de um “balneum” (termas)com paredes espessas e cadinhos de grés...(até porque a norte avistam uma grossa conduta de agua que vem do rio, semelhante á de Conimbriga).
Próximo, viam-se ainda restos de outras casas, em volta de um pátio interior, quadrado, como era comum  nas ricas casas romanas (do Norte de África, Coimbra ou Torres Novas) com fonte ao centro; também na Andaluzia...
Mas a invenção (achamento) mais singular - foi segundo parece - ali a de 2 lajes de pedra mármore com inscrições...
                                                 (INTERMEZO)
-Aqui o 1º Sábio  interroga-se : - Mas que pedras eram aquelas?
Possivelmente, simples aras votivas aos deuses,  junto às termas ou curso de água, como era costume entre os romanos.. há indícios de possíveis templos ou santuários na zona, dedicados  a Marte e Vénus...daí a mosteiros dúplices, só devido a imaginações lácteas, como aquelas que inventaram o Campus Stella... sempre à procura de  “exempla”, para suas pregações!
Perto, encontrou-se também um medalhão (de pedra) em baixo relevo representando um touro votivo igual ao encontrado no verso de moedas de Augusto e Tibério.

2º Sábio-...Embora também pudessem pertencer à cobertura de urnas, com seu resguardo de telhões, à maneira de templo, como também era usual nas famílias ricas : foram encontradas 2  sepulturas cobertas romanas  perto do Forum... possívelmente  alguns Edis sepultados junto ...
E tal  como aconteceu na região de Bezelga,onde se encontraram (além de uma calçada de mosaico romano,com nós de Salomão...) umas 7  dezenas de ossadas da época romana, junto a um cipo,várias “pedras com letras”  e 2 moedas datadas: sendo o achado atribuído aos santos mártires donatistas norte-africanos (sec IV)  do abade Donato (fundador na região de Valência do mosteiro de Servitanum) e seus 70 monges errantes ,pobres e vagabundos, também chamados do “Circumcélio” (neste caso ,talvez por afinidade: Circum Sellium - realmente perto de Sélium!)...aqui mãos piedosas, julgando-se perante santos despojos cristãos, ali resolveram erguer uma espécie de capela funerária de contorno quadrangular, com seus arcos e cúpula redonda (tipo martyrium) sacralizando e aformoseando o lugar... Aliás por todo o País, muitas lápidas de cidadãos romanos deram origem a ermidas ou serviram de pedra de altar de igrejas cristãs posteriores!
E, para reforçar este ambiente “sacro”, foi encontrada ali na margem alcantilada do rio, uma gruta natural, de cujos paredes escorria água, convertendo-se o lugar desde logo em centro de veneração (porque misterioso, como qualquer gruta: muitas vezes santuários femininos) criando fama ali as àguas de serem milagrosas, curadoras de doenças (se já não o eram antes, na memória moçárabe da região)...

3º Sábio:- Mas  voltando às tais lajes - que inscrições conteriam?
A tradição fala-nos de uma Casta e uma Júlia... Na hipótese de ter sido aqui  encontrada (entre outras ) aquela ara votiva a Pietá - abstração divinizada do panteão romano - dedicada por Valério Máximo e suas filhas (depois colocada no Castelo)...seria esse o nome das  filhas de Valerio? ... Culto flâmine também presente junto a Mérida e semelhante ao gesto de Tibério no ano 43 em Roma, dedicando também uma Ara Pietatis Augustae, com seus relevos onde são visíveis cenas  sacrificiais e processionais com carneiros e touros. Aliás a  imagem de um  touro em relevo numa pedra... jaz colocada, como sinal, na casa de Iria sobre o rio!...e a reforçar , existe uma moeda de Cascantum, do tempo de Tibério,com imagem semelhante...encontrada na zona.
Mas ,vejamos os nomes:  por outras pedras encontradas em Bobadela, Oliveira do Hospital, junto à  via romana frequentada por Valério,  sabe-se da existência coeva de uma tal Júlia Modesta , dedicante também de Aras a Pietá (culto familiar?) e com parentesco assinalado aqui na região, em S. Pedro Cast(r)o  : numa lápide que refere uma Antonia Modesta e uma Antonia Máxima... (Coincidência significativa: este epíteto de modesta  é uma variante de casta,entre outros significados,na lingua de Roma!)...
Aliás,se estes nomes aparecidos em vários locais correspondem ás mesmas pessoas,que comprovadamente  se  deslocavam amiúde,  então o rasto de Valério Maximo acaba em Coimbra ,onde se regista (vide Hubner)o seu epitáfio com 80 anos,á volta do final do século (podendo  portanto não ser este o conhecido cronista acompanhante dos feitos romanos)...
 
4º Sábio -Quanto à tradição existente duma  Stª Casta,freira, esta é mais tardia e não coeva.  Trata-se de uma popularização de um culto trazido para aqui pelos franciscanos da Umbria/Italia a Stª Rita de Cassia,mui popular desde sua morte  em 1457. Isso é visível no Almogadel, onde a imagem em hábito daquela patrona,é tratada no local  por santa Casta (popularização  de  Cassia)... Também próximo, temos o loco da Ave Casta ( primo castro romanizado e depois herdamento medievo de clérigo,com seus algares belos e misteriosos) certamente personificação do Paracleto : a pomba branca do Espirito Santo,mais a norte chamada de Stª Comba(de Columba).. aqui talvez memória rural romana de estatutária evocativa de Artemisa,a Casta (também representada por pomba).
Aliás na lenda de S. Iria,impressa e fixada pela primeira vez , nos breviários de Braga (1494) e de Évora (1528), portanto posteriores á morte de Stª Rita, abundam os  derivativos : Cassia, Casta, Castinaldo...
Cassia é omnipresente na região:  como mulher do governador, ou como mulher de funcionário romano na lenda de stª. Cita, pretensamente atribuivel à época imperial - sempre afinal em lugar de destaque - tão importante como foi no seu tempo a 2ª lei Cássia (43 AC) para a promoção dos plebeus a patrícios... o que também pode ser uma das memórias gratas aos municipes com assento no dito!
                 
A bela imagem quatrocentista de Santa Casta de Almogadel ,que "os filhos da terra" em 1983 resolveram  remodelar junto com  sua capela antiga , já que arruinada e fartos da ausencia de  apoiois oficiais ...(para o caso da imagem devem ter-se socorrido de algum pintor local...e talvez uma esteticista...) a culpa nao e' deles, face ao resultado actual ...o new look !

5º Sábio- Noutra hipótese, haveria junto ao rio alguma inscrição pétrea, fazendo referência à construção do espesso muro de cantaria ali erguido pelo acampamento militar romano denominado em latim: Castra Julia, por oposição a Praesidium Julia que significa guarnição ou praça principal (esta sediada em Scalabis O que também é coerente com a memória dos povoadores que referem aqui: uma fortaleza  e coincide com os sinais no terreno: paredes espessas de  dois pés e a assinalada presença de Maximiano, o construtor de muralhas  .  (conforme o miliário).
No Duzentos,quando se dá também a invenção do rio Nabão (antes rio Thomar) afirma-se num manuscrito “ sive Nabão fluvio,qui fluit justa castrum de Thomar”
É provável pois, que este conjunto de circunstâncias locais e temporais, fornecesse assim material para a lenda posterior de S. Iria e de suas “tias” Júlia e Casta .
Não esqueçamos que até Compostela, nasceu da lápide de  um simples cidadão romano! A peça mais jacobeia que existe é afinal uma ara romana (dedicada a Neptuno) onde se começou a dizer , que ali se amarrara a barca do Apóstolo...e que  depois, por isso, serviu de base a altar cristão no sec VI  em Stª Maria de Iria (Padrón)... Enfim, na época quaisquer letras latinas/romanas na pedra,excitavam as imaginações dos clérigos( e não só) medievais... sempre na demanda de santos em terra, monstros ou sereias no mar e dragões no ar! (hoje ainda há contudo  sinais intrigantes a serem considerados (por alguns letrados e não só) de origem extra-terrestre...mas geralmente sem carga divina...
   Coincidentemente... noutra região também de actuação histórica da Ordem do Templo, em Fonte de Arcada /Penafiel do vale de Sousa  - mais própriamente no Monte Mozinho, veio a ser “cristianizada” uma outra construção  tumular, com aras aos deuses do panteão   romano; e por ali serem encontrados muitos pesos de tear, certamente, se  criou a lenda de ser aquele o local da vida e martirio  pelos godos – no Cinquecento -  de uma tecedeira cristã chamada Iria.

6º Sábio- Mas aqui (Tomar), pela proximidade sabida de um mosteiro ou igreja  (de Sélio, de que trataremos adiante) se deu a invenção de uma Santa Iria, freira degolada - na tal gruta milagrosa - e atirada rio abaixo, a que  associaram Casta e Júlia como “tias” também freiras... criando-se assim a fama de ter havido cá um mosteiro dúplice, segundo a literatura legendária das Astúrias, pródiga em fornecer biografias  e nomes dos quais mal se conhece o lugar ou data de existência...
Mais próximo da verdade talvez o rimance popular, que em terras do Templo- como Santarém e Monsanto- canta Iria  levada por um cavaleiro... Efectivamente ao próprio Templo não seria desagradável , já que obrigados a perder Santarém, tão duramente conquistada  (sua sede) e transferidos para aqui de armas e bagagens, terem trazido consigo também o culto famoso da santa, criando aqui outro polo aglutinador de  gentes em torno daquela tradição. Terá  viajado a santa, entre Tomar e Santarém, sim, mas em sentido contrário ao da lenda e pela velha estrada romana, com os cavaleiros do Templo provávelmente!...      Verdadeiros cavaleiros “irénicos” , se atentarmos também naquele outro sentido: de se “entenderem”,  conjunturalmente, com outros povos do Livro...

E disse o 7º Sábio-  O que acho significativo , é que mais tarde com a queda da memoria do Templo , se desse também a “queda” do brasão original do burgo (que contava a estória do martírio de Iria em 4 quarteis) restando só a imagem da santa, certamente por pressão popular, se tivermos em conta, certas discussões camarárias no fim da Idade Média, sobre o Selo da Vila.
Depois deu-se também descaminho às lápides originais, fabricando-se uma nova “lápide conjunta” que explicava serem Casta e Júlia tias de Iria, “justificando-as” assim... Na escrita em pergaminho, costuma-se chamar a isto, um falso...

(selo do concelho de Tomar, no sec XIII, sg. nossa reconstituição, a partir da descrição de Pinho Leal)

-E o 8º sábio rematou :  “Descaminho”  que também aconteceria às próprias sepulturas dos Mestres da Ordem na época do tristemente célebre Frei António  o “nosso” Filipe, o Belo(!)... feitor de autos de fé a vivos e mortos, livros e pedras (!) - cujo irmão (Moniz) andou na fabricação do convento quinhentista  das Clarissas, ali onde era memória de Iria...

(Entretanto Gualdim regressa a seu  primeiro dia tomarense ... prosseguindo pelo carreiro ermo, que ainda vence a vegetação que o rodeia, outrora rua concorrida ,de norte para sul) .
À distância de um tiro de funda ,descobrimos  sinais de presença humana diferente, a avaliar pelas lápides encontradas: de lavor figurativo com desenhos geométricos gravados, cruzes gregas, rosas de seis fólios, palmetas estilizadas, cachos de uvas simbólicos (tal como o vinho se liberta da uva, assim a alma se liberta do corpo... eis a vinha do Senhor)... estávamos  pois agora em zona goda e cristã!
E mais a sul,  entre silvas e urzes, velhas paredes derribadas e uma cruz de ferro. Eis um mosteiro ou abadia cristã!... E senti  uma emoção forte , olhando aquele campo santo. Houvera alí, sem dúvida,uma igreja tipo basilical com seu poço batísmal a sul e  outras construções, certamente humildes, casas quandrangulares, místicas de pedra calcárea e madeira: ainda se viam sinais nas paredes dos encaixes de grossas traves, de carvalho porventura... talvez oficinas, cozinhas ou celeiros e currais, onde os monges guardavam seus carneiros...
Paredes edificadas sobre estruturas /antigas romanas aproveitadas e mais lápides e ossadas paleo-cristãs,tendo junto aneis,colares e até moedas ... tudo,  no chão  que  vai da frente da igreja até ao rio.  E me chamou a atenção uma moeda do imperador  cristão Constantino, com 2 soldados em pé olhando-se  de capacete e lança apoiando-se nos escudos...Ah aquela  universal milícia  que vamos ressuscitar!
 ...E enquanto os nossos  se dessedentam da jornada, num ribeiro de Canas que ali passa junto à igreja a sul  ...entretanto,  medito, imóvel, de pé, a mão  direita no punho da espada, enquanto meus lábios murmuram um Pater pelos irmãos que alí viveram e morreram... Ah,como seria belo aquele tempo, em que o cântico do Kheroubikan se elevava ao céu como “per fumum” (incenso) e os monges rezavam na postura antiga - de pé, braços abertos - enquanto o ostiário avançava para o altar, com os vasos sagrados, sobre um tapete de ramos e flores... Depois, quantas portas estouradas, quantas profanações, cripta devastada, a cruz derribada e substituída pelo crescente...a atestá-lo : uma moeda muçulmana ali encontrada datada do século oitavo e a ceramica escura :púcaros de barro e potes com asas,de bordos com perfis de secção triangular ( datada de á volta do milénio),encontrada nos  arredores
                                                                         {
Segundo as memórias escritas e confirmadas , aqui se localizou, efectivamente, a paróquia de Sélio, no século VI, na continuidade da Sellium romana; denotando ser esta uma urbe desenvolvida à época . Tal o afirma o Paroquial suévico de 565, que descreve a diocese de Coimbra (governada por Lucêncio, do Lorvão) estendendo-se do Douro até Selium (pelo menos até 650) e pertencente à metrópole de Braga.
Naquele tempo foi metropolita de Braga, S. Martinho de Dume o conversor dos suevos arianos em 559 - aquele que escreveu ao rei dos suevos, as chamadas “cartas irénicas” (tal como “Formula Vita Honesta”) ou sejam:  apelos à compreensão e ecumenismo. (á letra: Irénico vem de Iria ou paz em grego). Coincidência significativa: também se encontrou aqui uma moeda de Tessalónica (Grécia)...

Documentalmente, no século XVI,o cronista Pedro Alvares Seco, afirma haver aqui  2 mosteiros criados no ano 640, um de frades beneditinos em S,Maria do Selho e outro de irmãs clarissas ,ali onde era sinal de S.Eyrea,que sofreu martirio em 653...Provavelmente uma data de conveniência,porque assim tinhamos talvez uma monja e menina virgem de 13 anos,ideal para a lenda (segundo o intervalo de tempo que medeia entre as duas datas)...
 Mas essa  afirmação sofre pelo menos de 2 erros ou imprecisões: primeiramente, se foi Martinho de Dume quem os fundou, nunca poderia ter sido nessa data concreta , pois já não era vivo , vivera um século antes!...(S.Martinho chegou à Galiza em meados do sec VI e foi nomeado bispo cerca de 561,data do 1º Concilio de Braga. A sua acção pastoral insere-se numa série rápida de reis suevos,com curtos reinados,demonstrando uma certa instabilidade temporal- vide a Crónica coeva de Joâo Biclarense)... Aliter: não poderia ali ter havido na época, um convento das clarissas, pela simples razão de que S.Clara (que  fundou essa ordem) viveu no século XIII ou  seja ,uns  seis séculos depois!...
Caso aquela estória estivesse  associada  ao tempo de Martinho...podia muito bem ser afinal expressão da luta directa havida entre cristãos e arianos , suevos e godos (recordada pela tradição anterior da Iria tecedeira de Fonte Arcada, morta pelos godos)... Recordemos o tempo de Leogivildo ,o godo, que reune um sínodo ariano em Toledo e devasta o reino suevo em 584,tomando o seu tesouro real,repositório de sua história e tradição; lutas contra Hermenegildo o filho que se rebela em Hispalis/Sevilha por questões religiosas...e a própria perseguição a Joâo Biclarense que se refugia na região de Gerona...

 Mas, segundo outros,tal mosteiro dúplice e familiar (Iria e suas tias) da regra de S.Bento,  teria sido fundado por S.Frutuoso, que de facto viveu na data assinalada, e portanto torna aparentemente, a cronologia mais coerente.
 Só que por outro , S.Frutuoso não aconselhava mosteiros familiares, antes  criticava aqueles que  criavam  por si mesmos mosteiros em suas casas e terras, com seus parentes e servos (conservando a propriedade indivisa)... “onde se levantam discórdias e até perdição de almas”...quanto muito esta estória serviria como exempla ..se atendermos a seu desfecho e ao facto de ter havido,segundo sinais no terreno, um túnel ligando os ditos  mosteiros, ficando,.segundo a estória… a igreja  noutro local, junto ao paço referido!.(em S.Pedro Fins)....
O certo da época, é a realidade debatida em concilios regionais ,acerca da permanência de concepções diversas de monaquismo e crenças não ortodoxas entre cristãos e seus pastores , como o “cassianismo” e a decadência moral , condenados no 2º concilio de Hispalis/Sevilha(619) e a denúncia de residuos de priscilianismo gnóstico, de longa tradição lusitana,  no 3º concilio de Braga (675)... as experiências de coabitação em ascese de S.Paciano...dualismos e tentativas de separação da alma de seu envólucro grosseiro ou sarcófago em vida (curiosa aquela tradição de um sarcófago que se abre no meio do rio, mostrando/libertando seu santo conteúdo)... e outras teses de ligação directa  ao divino sem intermediários ( aqui confessores assediadores,etc)...
– Havia uma tal confusão doutrinal  na sequela do arianismo  acerca da natureza de Deus- que a discussão caira literalmente na rua como se queixa  irónicamente Gregorio de Nissa  evocando “o cambista que , perguntado pelo curso da moeda , responde com uma discussão sobre gerado e não gerado; entra.-se na padaria : o Pai, diz o padeiro, é maior que o Filho, nas termas ,perguntais se o banho está pronto. alegam-vos que o Filho saiu do nada !”...

 - Mendez Pelayo afirmou  que estas doutrinas continuaram subterrâneas na Galiza até à invasão árabe. Nós diríamos que até à Reconquista!... Pois  aquando da conquista de Lisboa  vemos  nas palavras de um  bispo referir Donato e Pelagio como santos varões...
 - O certo também  é que a regra de S.Bento é  só do final do  sec VIII . S.Bento funda a sua comunidade em Aniano no ano de 782....não podendo portanto aquele mosteiro ser observante de tal Regra...aliás a primeira comunidade beneditina no território de Portugal só se assinala no sec XI, segundo A. Matoso!
 E quanto a mosteiros fundados por S.Frutuoso nas  Hespanhas , estão registados apenas o  Peonense, Visuniense, Rupianense, Complutense, Novo, Montélios e ilha de Cádis)...

    A velha estrada que passava frente a S.Maria do Selho :   seguia depois para sul, onde se bifurcava;  uma via seguia a ligar-se a Emérita por Punhete/Abrantes, enquanto a outra descia para o rio Tomar, cruzando-o através de uma ponte em corcova com seus arcos romanos, em direcção a Santarém pela via XVI –o Pio Itinerario...( ponte agora  submersa,junto a S.Lourenco)..

                                 (Continua)

21.10.14

Afinal quais as origens e o que representa Santa Iria ?



Vamos traçar um quadro das varias origens possiveis da estoria de Santa Iria nos tempos medievos ate chegar ao ultimo seculo em cujo dealbar apareceu, em pleno Chiado de Lisboa  como uma santa modernizada , e primeiro caso conhecido na igreja, a publicitar um sabonete...como cuidados a ter com a pele ! Isto ha cem anos , na vanguarda da moda!
Este texto e’ constituido por excertos do livro pro-biografico de Gualdim Pais “ O Mestre Templario na fundacao de Portugal” e toma neste assunto a forma de um debate entre sabios...Devido a sua extensao , sera dividido em 3 partes, a sair sucessivamente ...

1 – Reflexao Santarena : A proposito da conquista de Santarem
...Na Ribeira, de ruas estreitas e sinuosas, que o rio amiude invade, fundam os do Templo a igreja de Santiago, onde colocam capelão da  Ordem.
Também  pertencendo  à colegiada de Sta. Maria da Alcaçova, ali se edifica outra capela dedicada a Sta. Iria, sendo seu 1º clérigo: Garcia Mendes. Segundo uma tradição, no areal defronte aparecera um túmulo de mármore com o corpo desta Santa (assediada por um monge e degolada a mando do filho dum conde godo,no ano 653)  e que logo fôra coberto pelas águas do Tejo; mas cuja memória e culto se tinham perpetuado em Scalabis, chegando a mudar-se o nome deste loco para Santarém (de Stª Iria) no tempo do rei Godo Recesvinto, que ali fizera erguer um basílica,junto ao rio...
                                                        (Intermezzo )
A  Assembleia dos 8  Sábios  reunidos na Torre ,  debatem entretanto , esta bela estória digna da Legenda  Aurea...
Diz o 1º sábio – O que sabemos deste  rei - Recesvinto – é que iniciou o seu governo, por coincidência, em Outubro deste ano de 653, por morte de seu pai em 30 de Setembro ... E caso a norma, quanto à coroação entre os reis godos seja um intervalo de três semanas - como aconteceu a seu sucessor - então Recesvinto deve ter sido coroado à volta de 20 de Outubro, o que não deixa de ser uma coincidência singular com a data em que se comemora Stª Iria...
Com Recesvinto atingiu-se o apogeu da Hespanha Goda, celebrando-se ainda nesse ano o 8º concílio de Toledo - na nova igreja de S. Leocádia - onde se fez a revisão do código  visigótico e se tratou dos costumes do clero,em degradação. É também o ano em que se reduzem os limites da Galécia ao rio Douro, afastando-a pois da diocese de Coimbra - a qual vai até Sélio ou Selium (Tomar), uma das suas sete paróquias. Posteriormente  a divisio de Wamba(672/680) confirma-o.
Na época daquele  rei convertido e piedoso - ofertante à Igreja de uma rica coroa votiva em ouro e pedras preciosas - realizaram-se ainda mais dois concílios: o 9º e o 10º (neste participou S.Frutuoso de Braga-em 656) onde se continuou a tratar de matéria disciplinar,com incidência na vida monástica .
Tal como Clovis o rei franco merovingio, convertido ao catolicismo,escolheu como seu atributo a flor de iris ou lirio (abundante nas margens do rio LYS do mesmo nome,junto a Poitiers onde vencera os  arianos em 507.).. também agora provávelmente à sua imagem (principal força  político-religiosa  a Ocidente) tal  fizera este  rei  godo  cristão trinitario  e campeão dos concilios ( 3 em seu reinado) ...Significativo: ..a flor do lirio  representa-se com 3 petalas e um caule–significando a Trindade e os 3 Ps: Pureza,Perfeição e Pharol ou luz do mundo...... Eis assim a  santa Iris de Clovis (o luminar e modelo da igreja da época)...assinalada junto ao rio agora godo-cristão...-...pura,perfeita e luminosa... afinal nem Salomão na sua magnificência se vestia assim..como os lirios .(.dizem as Escrituras )...

2º sábio- Ilustre  colega, ...realmente a haver uma  mártir, à época, o estranho é que tanto o bispo de Coimbra, Sisiberto, como o próprio S.Frutuoso, bispo de Braga, não se lhe referem em nenhum escrito ; embora este último, praticasse anualmente a reunião abacial, e portanto estivesse bem informado...(O que não obsta a que para a mesma época o bispo Ildefonso  refira até os pretensos milagres de Donato,o coevo monge transfuga! Com maioria de razão alguém falaria na época de uma mártir que ia dar nome a uma cidade!)...Ora três séculos depois (sec. X), o calendário místico de Córdoba (expoente da convivência cultural e religiosa, arabe e latina, na Peninsula), onde se anotam as festas dos santos cristãos, continua omisso neste facto. O que a comunidade paleo-cristã e moçárabe venera são antigos mártires da época romana e não goda (!)...como S.Vicente e S.Brás.

3ºsábio- Para nós,se há algo que é “decapitado” efectivamente naquele ano (653) é a paz ou estado de graça entre o Papa e o Imperador; concretamente 653 é a data insólita da prisão, julgamento e exílio(na Crimeia onde morre)  de um Papa de Roma - Martinho I - por um Imperador cristão de Constantinopola - Constante II ...é um  tempo de ruptura,face ao simbolo de Atanasio: “Perfectus Deus,perfectus homo”.
Martinho I acabava de condenar - no sinodo de Latrão-  a doutrina do monotelismo (que afirma ter cristo duas naturezas, uma humana e outra divina, mas uma só vontade) estando em vigor - por parte de Constante II - a proibição de qualquer discussão no império acerca das naturezas e atributos de Cristo, questão que dividia gravemente os cristãos ... e não se pode esquecer que nessa mesma altura, nascia também um novo e perigoso concorrente da Bíblia: O Corão que começava a unificar sólidamente as fileiras dos seus vizinhos infiéis a Oriente, passada à escrita a doutrina oral dos surates (versículos)...enquanto Jerusalém –a Amada- caia em  mãos infiéis...e era governada pelos Omíadas...

4º sábio- O que temos como certo é que, durante o sec. V com a quebra da estrutura civil romana e o desaparecimento da sua organização militar, ao longo nomeadamente, da estrada romana Scalabis - Conimbriga - aliada aos confrontos bárbaros na zona - estas duas cidades se reduzem lentamente a meros aldeamentos de ínfima importância, apenas pontos de referência. E tal como na vizinhança de Conimbriga, nasceu Coimbra assim também - e a geografia árabe refere-o - ao lado da Scalabis romana vai surgindo uma nova povoação crescente de importância, na Ribeira, junto ao Tejo, área de grande fertilidade.
Iacube - ainda no século XII - fará essa distinção, entre os dois locos ...
Ora, segundo a crónica do bispo Idácio de Chaves, esta região é tomada por Sunerico ao serviço dos visigodos, no séc V.(460)
E falando da  origem do nome deste loco- É muito possível que, tal como na Hespanha, a Andaluzia (passando por Vandalícia) procede dos Vândalos que a tomaram aos romanos, assim também a região de que estamos a tratar, tomasse o nome do seu presor - Sunerico - o que na evolução da linguagem terá dado posteriormente a Senerigo  de que nos falam os relatos da conquista em 1147 por Afonso Henriques.
(Ainda no século seguinte constatamos o godo Leogivildo,fundando cidades: Victoriam e Recópolis-esta em homenagem ao filho-junto ao Tejo em Zorita/Guadalajara)... Ora, nesta época , já  se perdera, evidentemente, a memória real da origem daquele nome - oscilando este entre Seterigo, Sesserigo e Senterigo (de onde também senterinis)...
Desta designação é fácil perceber a apropriação árabe: Xanterine, nome que vão dar ao castelo fortificado, que os mouros estabelecem no alto do monte. Por sua vez, os cristãos vindos para sul a quando do avanço de Afonso III de Leão - que elimina Xurumbaqui, o rei dos montes litorais entre Coimbra, Leiria e Santarém em 876 - ou aqueles que vieram com o rei Ordonho no ano 950, julgam-se perante uma tal Sancta Herene (por semelhança de pronúncia com Xanterine)... Aliás esta designação não se fixa, oscilando também, perdida a sua razão “árabe”, dando Eirea, Eyria, Hirena, Iria...é que ao serem introduzidos no português de época os termos árabes eles sofrem adaptações fonéticas e ajustamentos ou deturpações mesmo quanto á forma(morfologia)...

5º sábio- eu  acho que esta confusão é alimentada também pelos arquivos das Astúrias (sede dos cristãos refugiados, aquando da ofensiva árabe) propagando-se aos séculos posteriores: É o caso alí relatado da existência no norte hispânico, de dois calendários religiosos, já no sec. XI : o do mosteiro de Silos que regista em 1052 uma Stª Hirene de Tessalónica e o da Catedral de Leão que regista diversamente uma S. Eirene de Scalabicastro - mas no ano de 1067 - ou seja depois do  cisma de 1054 entre o patriarca Cerulário do Oriente e o Papa Leão IX a Ocidente (os quais se excomungam mútuamente, a propósito de questões litúrgicas como o uso do pão ázimo na missa e quanto à concepção do Espírito Santo, questão do Filioque como ficou conhecida...
Provávelmente ambos os registos daquela Santa, são apenas memórias desfocadas de uma outra realidade - mais espiritual, do que física - que teve seu desenvolvimento peculiar, tal  como a invenção de Compostela...
Concretizando: sabe-se que em meados do séc. VI, a arquidiocese de Braga, abrangendo toda a galiza, foi ocupada  por S. Martinho de Dume - o conversor dos Suevos Arianos e impulsionador do 1º Concilio de Braga - o qual estudou em Constantinopla (na época, capital do império cristão) , aí recebendo toda a influência doutrinal que possuia. S.Martinho traduz nomeadamente os Apoftegmas dos padres do Deserto...
A Oriente vivia-se então a idade de ouro de Justiniano (527-565). Depois de dois séculos de crise, a preocupação central deste imperador bizantino era a harmonia entre o Império e a Igreja, a paz e prosperidade tão necessários à alma e corpo dos súbditos...
Assim, durante o seu reinado, Justiniano edifica ou  reedifica duas igrejas próximas - que podemos considerar pois irmãs no espaço e no tempo - consagrando uma à Divina Sabedoria (em grego : Aya  Sophia) e outra dedicada à Paz Divina (em grego: Aya  Yrine).
A primeira será a igreja do Patriarca e glória da arquitectura, com sua fabulosa cúpula, como que suspensa do céu, em seus mosaicos”ismit”, pintados a verde e azul, qual Jardim do Eden
A outra igreja (S. Herene ou Iria) dedicada pois à Paz Divina, é reconstruida nesta época pela segunda vez após incêndio, sobre um antigo templo pagão. O seu estilo arquitetónico é o de uma comunhão entre a basílica do ocidente e a rotunda oriental, com suas duas cúpulas na ampla nave central e abóbodas várias nas naves laterais, cujas paredes são rasgadas por 3 niveis de janelas de arco ao romano, que assim iluminam profusamente os belos frescos interiores , com motivos celestes.
Esta igreja, onde em 6ª feira Santa  se depositava a Sagrada Lança ,, servira já transi tóriamente, no século anterior, como catedral, no reinado de Teodoro II.
As 2 igrejas tinham nesse  sec VI uma cleresia composta por quase 500 elementos  entre sacerdotes, diaconos,subdiaconos, leitores, cantores  e outros!...
 
(igreja de St. Eyrine ou da Paz Divina em Istambul, frente a S.Sophia ou Divina Sabedoria)

6º sábio-  Ambas as igrejas são portanto de invocação simbólica e não a santas reais, prática aliás, comum na igreja oriental e deveras visível nas companheiras “gregas” de S. Iria nos calendários litúrgicos da época medieval: Stª. Pitis (em grego: Fé). Elpis (Esperança), Ágape (Caridade), Chionia (Pureza), Sofia (Sabedoria) - tais nomes de santas,  não são mais do que alegorias de virtudes cristãs teologais e morais ou frutos e dons do Espiríto Santo, respectivamente!..(cf: P. Miguel de Oliveira,64  e  Mario Girardi,83). 
Circa do ano 1000 foram  personalizadas no 1º teatro edificante cristão conhecido,obra da monja alemã Roswita de Gandsheim,que nos apresenta a mãe Sabedoria e suas 3 filhas virgens e noivas de Cristo,mortas á espada a mando do imperador Adriano... assim, popularizando a velha carta de S.Jeronimo ás mães, exortando-as  a serem  sogras de Deus (sic)!.. entregando-lhe suas filhas, pois “é melhor casarem com um Rei,do que com um simples soldado”.. .Assim, com tantas sogras...Deus tornou-se definitivamente invisível! ... ( gargalhada geral dos Sábios)...

7º sábio- Bem, no séc. XII, já há muito se esquecera o grego em Hespanha, o que explica a tal memória desfocada de que falámos atrás... Ainda recordando a época visigótica: a partir do 3º concílio de Toledo (589)  a corte Goda adopta na peninsula ibérica, hábitos bizantinos, depois de sua conversão pelo também frequentador de Bizâncio, São  Leandro (irmão de S. Isidro de Sevilha) e o próprio rei Recesvinto - a partir do início do seu reinado - vai aprofundar essa ligação ao oriente. São fruto dessa época - tanto a sul (Mértola) como a norte (Lamego) as cruzes gregas que aparecem nas sepulturas cristãs lusitanas.
Adoptamos também o uso , generalizado na liturgia oriental, dos dias da “féria” e não astrológicos. E certamente , não será por acaso, que a maior parte dos nomes de santos das Beiras e Minho, são santos orientais. Aliás a 2ª metade do Seiscentos é marcada pela chegada do 1º papa grego-Sergio- e pela introdução de uma série de cultos orientais a ocidente...E posteriormente acontece até que vários santos com actas apócrifas de martírio passam a receber veneração litúrgica...
Na continuidade, também o rito moçárabe se inspirará no sírio-grego e bizantino...cultuando o seu santoral específico :  Sª Columba, S.Cucufate, S.Mamede e Sª Iria...
Mais, da própria Scalabis, partirá cerca do ano 570, ainda jovem, um tal João Biclarense para Constantinopla,onde estuda durante 7 anos letras latinas e gregas. (compõe uma crónica sobre o reinado de Justino a oriente e Leogivildo a ocidente) e donde regressa em 578, mas sendo perseguido por Leogivildo, no periodo da disputa religiosa  com Hermenegildo, afasta-se para Gerona, onde funda um mosteiro,com sua Regra, segundo a crónica de S. Isidro. Participa no concílio de Toledo de 597. O que exemplifica  uma certa ligação espiritual na época entre Santarém e Constantinopla... (tal como no século anterior da Galécia partira em peregrinação ao oriente -Jerusalém e Constantinopla- uma certa Etérea...com possível ramo familiar em Antioquia, de onde João colige noticias de um curator ,o patrício Etéreo circa 560,em rebelião com Justino)... Mas há mais: tal como Avitus em Braga anteriormente, também agora Libério - em 580 - oficial ao serviço de Bizâncio na Lusitânia e na Bética, para aqui traz naturalmente alguns dos seus cultos particulares... Essa  influência é directa ,até ao ano 621.

E o 8º e último Sábio concluiu: -  É possível, portanto, que em Santarém se tenha dado ao longo dos séculos uma comunhão reforçante e acidental dos dois factos: o nome do presor godo, adulterado pelos árabes e a memória cristã de um culto oriental, já esquecido o seu significado grego...
Clarificando a lenda: por detrás da chegada, pela águas, à ribeira de Scalabis de “Santa Eyria”, esconde-se a chegada do Godo Suneric ao areal, alí fazendo presúria, para além da ligação manifesta do burgo santareno ao Oriente: enquanto  grande porto fluvial do mundo com seu  deposito  de mercancias.
Coincidência significativa : na Grecia existe uma ilha chamada  Santorini e um santuario chamado de Iria em Naxos, lugar de cultos vários , desde a época micénica...
...Aqui, no conventus scalabitano, do tal rei Recesvinto resta-nos como sinal confirmado, uma moeda de seu reinado cunhada em Hispalis/Sevilha e encontrada no caminho entre Tomar e Torres Novas ...

                                               (Continua)


29.3.14

DIDACHÉ - Iniciação do cavaleiro Templário






Onde se trata dos conteúdos que nos propomos  apresentar e representar no castelo templário de Tomar . Primeiramente, trata-se de um texto feito de raiz para este espaço e adequado à sua especificidade . Não fala de algo importado da vida de qualquer outro mosteiro, sim do que se passava intra-muros à luz do que  conhecemos...


PrólogoNaquele tempo, dionisino, existia um Portugal verdadeiro e fundamental, caracterizado pela cooperação e pela fraternidade…hoje uma alma em dormência , nas palavras de Agostinho da Silva.

Efectivamente, a atrofia de memoria cultural, e o endeusamento do efémero, é um traço dominante da 2ª metade do seculo XX . A grande maioria de nós já não é capaz de identificar as passagens centrais da Biblia ou dos clássicos, que foram o alfabeto de nossas leis e instituições...(G. Steiner)
A espessura da memória só será preservada, se dermos importância acrescida ao tempo histórico e á reflexão sobre o mistério das coisas e da vida.... ligando o conhecimento á compreensão deste nosso mundo : este , o vero culto da Sabedoria ...afinal a Idade Media foi o início da Europa de hoje ! (H. Godinho-Un .Nova) .

Urge preservar as raízes de nossa identidade e para tal , a melhor defesa (da tradição , do tempo mítico e do espaço sagrado) é torná-las vivas, fazer a recriação, actualização ,desses valores perenes e do património… (J. Anes- REAA)
Com a perda do sentido da memoria da humanidade, o vazio entrou em nossas vidas e a calma e a luz são-nos quase alheias. Tabucchi, considera como constante premonitoria do ultimo seculo,o dessasossego(mal estar) diagnosticado por F.Pessoa ..desilusão de viver, falta de prosperidade e paz...a inquietação que nos assola.

O reencontro com essa idade de Ouro, é a nossa demanda, aqui e agora, nesta cidade irénica ou da paz espiritual...através de uma acção cultural, entendida como aquele “misterioso elemento que despertando , permite abrir momentâneamente a nossa percepção...possibilitando o encontro com essa verdade , que nós sozinhos dificilmente poderiamos alcançar (Peter Brook) ...ou nas palavras de outro autor cénico : por uma animação teatral “enquanto forma de meditação , que alargará o aparelho sensivel do homem, à visão dos espaços secretos “ (Wilson, 92).

O texto propõe uma construção para a realidade da época templária, desenvolvendo-se como um vero “Jeu” entre o que permanece oculto (enigmas , lacunas documentais) e que é visível ,mostrado, revelado (Phainomenon.) numa aproximação coeva , tanto quanto possível á distância de uma geração ( de 30 anos) no que respeita a nomes, actos ou pensamentos...

Composição fabricada a partir (como soe dizer-se ) das mais desvairadas fontes documentais e justificando-se no pensamento de Poincaré quer afirmou que “as combinações mais ferteis são formadas de elementos retirados dos dominios mais afastados”…
Texto mìstico de prosa e algum verso, espelhando uma época de transição, á imagem da literatura de chantefable como “Aucassin e Nicolette” composto no sec XIII… com partes para serem contadas e outras cantadas…


A acção ritual acontece circa 1286- no castelo templário de Tomar, onde o Mestre da Ordem, D.João Fernandes, inicia um sobrinho em Capitulo, segundo um testemunho, relatado nas inquirições de D.Dinis de 1317.
Evocação histórica, balanceada entre o rigor historico e a necessidade de agradar a um vasto publico, buscando divulgar e explicar , sem se tornar uma tese ou missa pesada para os convivas... mas sempre tendo em conta que o ritual tem um presença considerável na vida social da época : um mundo de gestos, mais do que palavras escritas, como diz o historiador J. LeGoff…onde as figuras serão reanimadas pelos ritos ... como na velha crença egípcia.

A organização do tempo ficcional (contido aristotélicamente em uma única revolução solar) acompanha a estruturação do espaço : 4 actos - cada um em sua mansão...Trata-se de uma encenação “ao medievo” tipo auto da Criação- que se desenrola no Terreiro do castelo ,como Iniciação através dos 4 elementos : Terra- Água–Ar–Fogo,á semelhança do que está figurado nos capiteis da Charola e conforme á doutrina Hermética:“a imagem do que está em cima:é o que está em baixo
Teatro de mistérios- dos menores aos maiores- como uma sucessão de frescos giottescos, desde as antigas Iniciações até aos dias do Templo; representação didáctica em defesa e louvor da Milícia Templaria ...
Efectivamente, baseados na tradição universal ,mas tambem na local e alicerçados na autenticidade da Regra primitiva descrita por Regine Pernoud, tentamos esclarecer as 3 principais acusações feitas aos templarios no seu tempo: o beijo na boca, a vituperação da cruz e a adoração da cabeça "bafometica"... afinal : um ósculo cortez, a evocação da Paixão e o culto das reliquias na época... respectivamente!

Evocando velhos e novos ritos templarios, buscamos tambem encontrar o tronco comum a todas as iniciações (básicamente 3 estados : purificação, comunicação de segredos e visão plena da Realidade ) de forma que seja útil a todas as crenças e filosofias....
Cenográficamente naturalista- já que é o proprio monumento real que nos envolve... com suas muralhas, portas, arcos, frestas, capiteis, abóbada, escadas,arvore ,tanque... em sua função original... mas que não só os mostra, também os anima- dando-lhe vida, alma- expôe emoções/vibrações de época...uma autêntica atmosfera do lugar, tanto no espiritual como no temporal , acercando-nos da vida do sec XIII.
As cenas são como capiteis animados, estátuas que se movem, que exprimem o ser com o gesto e o rosto, duma forma naturalista... como Daniel que sorri e mexe o pé, no Portico da Gloria compostelano!

O objectivo é mostrar o processo da Iniciação, a atitude do candidato ao Templo a caminho da perfeição, através de quadros significativos : a fera que confronta o homem junto á arvore terrestre , a dissolução da forma material no nivel liquido, o ser alado nas escadas , o fogo espiritual na Charola...

Usa visões simbólicas para exteriorizar a angústia e o êxtase : o dragão... a hóstia de luz ; nesse sentido uma representação expressionista : expressa estados de alma, mostra a realidade interna do personagem , a passagem para a luz do candidato, a sua evolução espiritual...através da via probatica e do sacrificio...”no estado de degenerescência, depois da queda, é pela pele (pelas provas,dor espiritual,sacrificio corporal) que se hão-de clarificar/iluminar os espiritos... diz Artaud.
Expôe o conflito da alma, arena de luta, na visão da monja Hildegarda de Bingen
( sec XII) , entre o bem e o mal - numa linguagem visual ,comum a hoje e ontem…

No amplo Terreiro,o registo interpretativo é, como não podia deixar de ser, expressionista,na voz vibrante e no gesto largo; já no interior da Charola,adquire um tom salmódico e comedido,próprio ao cerimonial que aí decorre...
Acção dramática , onde há um percurso iniciatico ,uma progressão/subida ao Terreiro, como Purgatório/ purificação do cavaleiro, na via do espiritual : á imagem do caminho fragoso e difícil de Dante …mas no fim, alegre e deleitoso…como dirá o nosso Camões, ( Lusíadas,9.90) - ao atingir a platónica Planicie da Verdade ou paraíso terreal na Charola, pequeno planalto coroando o Monte sacro , onde reside a cavalaria mística e hiperbórea (a norte do castelo).

Segundo Ricardo de S.Vitor, a ascensão da montanha é o conhecimento de si e o que se passa no cimo, conduz ao conhecimento do Divino.
Percurso alquímico através do qual o homem transmuta sua natureza inferior de chumbo, elevando-se ao estado purificado do Ouro.
Aqui tudo obedece a um simbolismo : se as cores e vestes indicam uma posição social, os objectos ,esses, não são vulgares instrumentos, são meios de fazer pensar e sentir, estimulando a imaginação dos convivas, que meditam e percorrem o caminho da Demanda, ao encontro do Espirito da Luz .
Ritual simbólico com o objectivo de obter uma vida anímica superior, onde , em contacto físico com local marcado pelo transcendente, se recebem ensinamentos e experimentam certas emoções ou estados de alma.
Em suma: uma viagem /peregrinação de aperfeiçoamento e conhecimento : há algo mais , para além do visível , a procurar !
- Tudo em ambiente mágico e real - onde a qualidade é dada pelo rigor á época e seu pensamento...incluindo uma certa " libertas goliardica" , anti-naturalista, para acrescentar o gozo anímico dos participantes…onde se recupera a comunhão do teatro medieval... onde todo são envolvidos e participam em união.

Um teatro de identificação : onde o monge se identifica com Cristo sofredor, percorrendo arfante com a cruz a via sacra ou sendo estigmatizado como S.Francisco; o iniciado se identifica com o carrasco pecador, batendo ,injuriando , negando a Cristo...e chorando de arrependimento...e o público que se identifica com a crença : apedrejando ao vivo os carrascos/saiões na Semana Santa da Valhadolid medieva ...ou vibrando em enthousiasmus (o divino em si) aqui, como na Grecia antiga ... em roda da Arvore simbólica e real , meditando em movimento.

Teatro de exaltação, revelação, decifração e metamorfose... onde os convivas obtêm respostas para si mesmo,renovam suas forças interiores,sua vontade,superam-se a si proprios...tornam-se Outro! ... porque aqui divertir é ver de outra forma, uma nova visão transformadora, elevando a sua consciência do mundo em que vivem e da vida ...favorecendo o Espirito da fraternidade , a que apelava J. Rousseau in carta a D’Alembert (1758) : “ convertam os espectadores em espectáculo, façam-nos actores, façam com que cada um se veja e goste de si proprio, para que desse modo se sintam mais unidos”… Em suma, um teatro edificante, proporcionando uma mudança de atitudes, do individualismo/egoísmo á solidariedade!
À imagem- actualizante- do mistério dominical, a prática deste ritual fará coincidir o presente da acção e o presente da representação ( re-presentar é tornar a ser presente) ; desta guisa , todos serão iniciados, em algum grau, tal como o cavaleiro-iniciado... A prática gestual dos conceitos essenciais, colocá-los-á no coração do misterio imemorial. Na via da Demanda da Perfeição, "em sonho e realidade, que faz a vitoria da condição humana"...segundo o discurso magistral de M.Oliveira,cineasta.